Quênia: o nosso primeiro amor no continente africano

Há poucos dias retornamos de uma viagem de 40 dias pela África. Realizei um sonho antigo e me apaixonei pelo continente, que surpreende não só pelas paisagens exuberantes mas, também, por seu povo alegre e receptivo. Passamos por oito países e voltamos encantados com tudo que vimos por lá.

Essa foi a nossa primeira experiência de viagem em grupo. Fizemos dois tours – um de 3 semanas e o outro de 9 dias – com a G Adventures, uma das maiores (e com melhor custo- benefício) empresas de viagens de aventura.

Como fizemos muita coisa por lá, vou dividir o conteúdo em vários posts. Nesse aqui, falarei sobre os nossos dias na África do Sul e no Quênia. São tantas fotos lindas, que eu tô tendo o maior trabalho pra não deixar o post super pesado com imagens.

Primeira parada: Joanesburgo, África do Sul

Como já tínhamos uma viagem marcada para o Brasil no comecinho de outubro (tá difícil acompanhar as nossas andanças, né?), passamos três semanas na Bahia e depois pegamos um voo de São Paulo para Johanesburgo, África do Sul. Ficamos lá 3 noites, antes de voarmos para Nairobi, no Quênia (onde o nosso primeiro tour teve início) e outras 3 noites ao final da viagem, antes de voltarmos ao Brasil.

Nos hospedamos no Signature Lux Hotel em Sandton e gostamos muito da localização e das instalações. Fica bem em frente à praça Nelson Mandela, onde há muitos restaurantes e lojas.

IMG_3828
Nelson Mandela Square, um dos pontos turísticos mais famosos de Joanesburgo

Pra ser bem sincera, não gostamos de Joanesburgo – também chamada de Joburg. Só voamos para lá por conta do valor das passagens saindo de São Paulo. Os atrativos turísticos não eram de muito interesse para nós e passamos a maior parte do tempo nas proximidades do hotel.

Muitas das pessoas que visitam a cidade, vão para fazer o safari no Kruger National Park, a 4 horas de distância. No parque, inclusive, você tem a opção de fazer o self drive  e dirigir o seu próprio carro durante o safari. Como já faríamos a atividade em outros dois países (Tanzânia e Zâmbia) não visitamos o local.

Foi bom ver as diferenças entre a África do Sul e os demais países, mas Joburg é um lugar que eu jamais voltaria. É uma cidade sem vida ou identidade cultural, com trânsito caótico e prédios feios. Os moradores não são tão simpáticos e saímos de lá com a impressão de que turistas não são bem-vindos. Queríamos muito ter conhecido a Cidade do Cabo (que todo mundo se apaixona ao visitar), mas dessa vez não foi possível.

Um amor chamado Quênia

De Joburg voamos para Nairóbi, capital do Quênia. Nos apaixonamos pela cidade e pelo seu povo. Decidimos chegar lá alguns dias antes do início do nosso tour, assim teríamos a chance de explorar os atrativos turísticos com calma.

Nairóbi é muito mais desenvolvida do que eu esperava. Passamos por um bairro onde praticamente todas as casas possuíam painéis de energia solar. Assim como em vários outros países africanos, sacolas plásticas são proibidas no Quênia e os supermercados disponibilizam sacos feitos de TNT ou de papel.

Nos shoppings, a segurança é reforçada com seguranças armados e detectores de metais. Aliás, a revista é feita até mesmo nos carros, antes de entrarmos em parques e lugares privados. Tudo isso foi implantado depois do ataque a um shopping center da cidade, ocorrido em 2013.

Onde ficar?

Ficamos no Sentrim Boulevard Hotel e gostamos bastante do serviço. Há um restaurante dentro do hotel e a comida é razoável. No estacionamento, alguns taxistas aguardam a chegada de turistas e oferecem tours pela cidade.

Atividades

No primeiro dia, combinamos com um motorista (você também pode usar Uber)  para nos levar ao David Sheldrick Wildlife Trust e ao Giraffe Center. Adoramos os dois lugares!! A minha paixão por elefantes não é novidade pra ninguém, né? Fiquei encantada com os filhotes órfãos que são resgatados pelo projeto.

IMG_3887
Os elefantes são resgatados pela equipe do orfanato após se tornarem órfãos e não terem condições de sobreviver sozinhos
OLYMPUS DIGITAL CAMERA
Muitos se tornam órfãos após caçadores matarem as suas mães, outros as perdem para doenças e acidentes naturais

Visitantes pagam o equivalente a 5 dólares, têm a permissão de passar uma hora no local – das 11 ao meio-dia – e assistir aos elefantes sendo alimentados pelos cuidadores. Não é permitido alimentar os bichos ou ultrapassar a barreira de proteção. Ainda assim, os mais brincalhões chegam bem perto e podemos tocá-los. Eles são muito lindos!!

OLYMPUS DIGITAL CAMERA

OLYMPUS DIGITAL CAMERA

De lá, seguimos para o Giraffe Center (entrada USD5), que não ficava muito longe. No local, nós podemos alimentar as girafas e, não há um limite do tempo que podemos interagir com os bichos.

IMG_4172
Funcionários distribuem amendoins para os visitantes e você alimenta as girafas por quanto tempo quiser
IMG_4103
As girafas não curtem muito quando a gente tenta fazer carinho, por isso, é preciso ficar bem atento aos movimentos delas, já que podem nos machucar com o pescoço super ágil
IMG_4090
Quem resiste à essa carinha fofa?
IMG_4175 2
Dá pra subir numa estrutura de dois andares, para que a gente fique no mesmo nível das girafas.

Na terra do Rei Leão

Outro lugar que valeu muito a pena conhecer foi o Hell’s Gate National Park, que fica a duas horas de distância de Nairóbi, às margens do lago Naivasha. O parque inspirou o filme O Rei Leão e é muito lindo! Pagamos USD150 para que o motorista nos levasse e passasse o dia inteiro conosco, retornando ao hotel por volta das 18h. Lá, pagamos 10 dólares para um guia que conhecia muito a região nos acompanhar durante a trilha pelo parque.

OLYMPUS DIGITAL CAMERA
A taxa de acesso ao parque é de USD26 e, apesar de distante, vale a visita
IMG_4376
Saímos do hotel por volta das 7h e levamos frutas, protetor solar, bastante água, câmera fotográfica e sapatos confortáveis
OLYMPUS DIGITAL CAMERA
Uma pausa na trilha para jogar xadrez com moradores do parque, pertencentes à tribo Maasai, uma das maiores no Quênia e Tanzânia

Além do cenário espetacular, o parque é repleto de animais selvagens. Vimos muitas zebras, javalis, impalas, macacos, dentre outras espécies. Você pode fazer o passeio de carro, a pé ou de bicicleta. Há também a opção de acampar no local, o que muitas pessoas fazem, ao invés de se hospedarem em Nairóbi.

IMG_4338
Muito cuidado com comidas e pertences, pois os macacos não perdem a oportunidade de pegar tudo que a gente deixa desprotegido
IMG_4361
Baboons estão por toda a parte no parque e nas estradas do Quênia

Se você, assim como eu, assistiu umas dez vezes o filme O Rei Leão, vai se emocionar quando chegar aos cânions que inspiraram a cena do cemitério dos elefantes. Primeiro, avistamos o vale do alto, depois, pegamos um caminho até chegar lá embaixo, onde a vista é surpreendente.

OLYMPUS DIGITAL CAMERA
A trilha não é difícil, mas requer certos cuidados, como sapatos apropriados, pois o terreno é cheio de pedras, poças e descidas íngremes
IMG_4388 2
Nos cânions do Hell´s Gate National Park

Depois explorar o parque por algumas horas, almoçamos no museu e Centro de Conservação Ambiental Elsamere (comida deliciosa! 15 dólares o buffet livre com suco e sobremesa inclusos). O lugar pertenceu a Joy e George Adamson, casal que durante muitos anos lutou pela conservação da vida selvagem no Quênia. Os dois ficaram famosos quando, na década de 50, adotaram uma leoa órfã e a devolveram à natureza, depois que ela se tornou adulta e apta a sobreviver na selva. Infelizmente, não tínhamos permissão para tirar fotos na casa/museu.

Ainda nas proximidades do parque, há a opção de fazer um passeio de barco no lago cheio de hipopótamos. Choveu bem na hora que iríamos pra lá e tivemos que cancelar o passeio. Mas, pelo que ouvi de quem já havia feito, a experiência é fantástica. Saímos de lá por volta das 16h.

Uma tarde rodeada por crocodilos

O nosso último passeio na capital do Quênia foi uma visita ao Mamba Village, onde há uma fazenda de crocodilos com cerca de 70 animais. Vimos os bichos sendo alimentados e até seguramos um filhote. Pensem no medo que me deu? Agora multipliquem por dez!! hahaha

IMG_4179.JPG
Ficamos bem pertinho dos crocodilos, mas com uma barra de proteção, lógico
IMG_4220.jpg
Esse deve ter sido o sorriso mais falso que já dei. Eu tava morrendo de medo de levar uma mordida

No local, além de interagir com esses bichinhos super meigos, você pode andar à cavalo, montar num camelo, alimentar um avestruz e passear de pedalinho por um lago (sem crocodilos haha). Há também um restaurante com buffet livre pelo valor de 15 dólares.

Depois de alguns dias em meio à natureza e aos animais do Quênia, nos juntamos ao grupo com o qual viajaríamos pelos próximos 21 dias.

Está planejando uma visita à África? Então, se liga nessas dicas:

  • A vacina da febre amarela é obrigatória. Você não consegue embarcar para nenhum país sem apresentar o cartão internacional de vacinação. Importante lembrar que a vacina deve ser tomada com 10 dias de antecedência.
  • Pílulas de prevenção à malária também são super importantes.
  • Não solicitamos nenhum dos vistos com antecedência e pegamos todos nos aeroporto e fronteiras. Para visitar o Quênia, você pode solicitar o “East Africa Visa” online. Ele custa USD100 e é válido para o Quênia, Ruanda e Uganda. Caso queira apenas o visto para o Quênia, você paga USD50 e pode conseguir no aeroporto.
  • Leve muito repelente
  • Roupas: leves, tons claros, nada muito curto ou transparente. O povo africano é super conservador e muito religioso. Em algumas regiões, a maioria da população é muçulmana. É claro que dá pra usar shortinho em certos passeios, mas em algumas ocasiões, não é aconselhado.
  • Sapatos confortáveis. Um tênis de trilha é aconselhável, já que quando chove, os parques ficam cheios de poças de lama.
  • Sempre tenha lenços umedecidos e álcool em gel na bolsa. Ajudam muito nas horas em que a gente precisa usar banheiros públicos.

Aqueles que não pedem pra sair

Dizem que os amigos de infância são os únicos que realmente nos conhecem, pois nos viram crescer. Os amigos de intercâmbio deveriam fazer parte do mesmo grupo. Porque morar fora é – como eu já disse certa vez – dar luz a um novo "eu", é ser mãe e pai de si próprio.

Os amigos que também são imigrantes, acompanham o nosso renascimento. Eles nos observam enquanto a gente se recria, sem pai e mãe ao lado pra educar e dizer se tá certo ou errado. Ou pra fazer curativos quando a gente quebra a cara. E a gente quebra demais, né?

O amigo imigrante é aquele que segura as nossas maiores barras, porque os problemas agora são reais e o tempo passa voando. Ainda ontem era 2012!

Ninguém chora porque quer sair e a mãe não deixa. A gente chora porque não pode estar ao lado da mãe doente, do pai com problemas financeiros, dos amigos antigos. Choramos porque a gente perde a chance de nos despedir de quem nos deixa e de dar boas vindas a quem acabou de vir ao mundo. Quantos natais ao lado da família, casamentos, batizados, aniversários você perdeu?

Choramos porque falta dinheiro, falta trabalho, falta paciência, falta o colo dos avós. Choramos porque a gente achou que seria mais fácil; porque a língua é complicada, porque a cultura é estranha. Porque confiamos em alguém que nos passou a perna e tudo parece dar errado.

Choramos porque queremos ficar e, muitas vezes, parece impossível. Quem nunca? A gente chora porque mesmo chegando tão longe, acha que não chegou a lugar algum.

E, nessas horas, o seu novo amigo de infância te acolhe. Te relembra passo a passo o quanto você cresceu, tudo o que conquistou e o que ainda está ao seu alcance. O amigo imigrante sabe de verdade o que você sente. Ele não está só te confortando. Ele tem as mesmas saudades, as mesmas dúvidas e angústias. Ele está – ou em algum momento esteve – tão perdido quanto você. E é por isso que a vida se encarregou de te apresentá-lo.

A gente também chora de alegria. Com o visto que foi aprovado, com o primeiro emprego naquela cafeteria quando a gente mal falava a língua; choramos com a conquista de um diploma no exterior, com o pedido de casamento inesperado. Choramos com a ligação pra contar que a vaga naquela empresa dos sonhos é sua ou quando a amiga compra o seu primeiro apartamento. Choramos quando o teste dá positivo e uma nova vida está a caminho. E a nossa família aqui fora vai aumentando.

Nessa montanha-russa que a gente vive quando decide morar fora, muitos vão pensar em desistir dezenas de vezes, até que os altos e baixos deixem de assustá-los. Não é que tudo se torna mais fácil, mas a gente sabe que tem uma mão ali ao lado pra nos amparar. E isso conforta.

São os amigos que ficam e, que sentam bem pertinho de você nessa jornada – aqueles que não pedem pra sair e não te abandonam quando a montanha-russa dá umas voltas de ré, ou quando você não está lá no topo, mas sim, parado lá embaixo -, que tornam a vida de imigrante menos solitária, muito menos assustadora e muito mais gostosa.

Obrigada, meus amores. Eu já teria descido há muito tempo se não fossem vocês.

O que te transforma também te fortalece

Hoje eu acordei super cedo e passei um bom tempo pensando sobre pessoas, livros, lugares e acontecimentos que, de alguma forma, me transformaram. Era apenas um exercício bobo para tentar achar um tema para uma nova crônica. Quando me dei conta, eu já tinha reunido um bocado de lembranças deliciosas. 
Disse aqui há algum tempo que convivi pouco com a minha mãe – eu tinha cinco anos quando a perdi. Mas ela foi a primeira pessoa que me veio à cabeça quando procurava alguém que havia me transformado. À ela devo a minha alma livre, viajante e a minha curiosidade. Thanks mommy! 

Pollyanna, livro que eu li há uns 20 anos, me ensinou muito mais do que o Jogo do Contente. Devo à personagem o meu bom humor e o sorriso no rosto mesmo em situações complicadas. Eu choro – e muito! Mas se tem algo que eu sou ao extremo – além de tagarela – é positiva.

Foi na Ásia que eu aprendi que não queria ser turista e sim viajante. Aprendi que, mais do dicas e listas do que fazer em um local, eu queria compartilhar experiências e reflexões. Aprendi também que ao fugir do roteiro pronto, eu descobria os meus próprios paraísos. 

A parte mais difícil foi escolher apenas um acontecimento que tenha me transformado. Óbvio, posso contar vários. Mas eu não queria usar nenhuma tragédia e nenhum momento de extrema felicidade. Foi aí que lembrei de uma conversa que tive lá em 2011 com a minha então chefe-amiga-mega-talentosa Dani. 

Eu andava meio perdida, desmotivada e com o coração bem apertadinho. “Arittinha, você tem que explorar o mundo! Vai morar fora! Você é nova, talentosa e cheia de energia! Se manda!”. Aquela conversa corriqueira, ocorrida entre uma pauta e outra, foi o (re) começo de tudo. Foi o momento de transformação da Aritta que esperava as coisas acontecerem para a Aritta que FAZ as coisas acontecerem. O resto da história vocês já conhecem.

Sabe aquele ditado “O que não te mata, te fortalece”? O que te transforma também vai te fortalecer. E muito! 

E você? Já parou pra pensar em tudo que te transformou? 

Um dia eu sonhei com tudo isso


Num dia frio no inverno de 2013, eu disse ao meu amigo Mateus que iria para a Ásia. Assim, do nada. Nem falávamos sobre sonhos ou viagens. Falei porque aquilo não me saía da cabeça. 
Eu não sabia como chegaria lá, pois naquela época o dinheiro era contado. Ainda não fazia ideia de como realizaria o meu sonho de conhecer o Camboja. Mas eu sabia que um dia o realizaria. Anos antes, eu havia sonhado em morar fora. E lá estava eu completamente apaixonada pelo Canadá. 

Um ano e meio depois, em Março de 2015, escrevi um texto sobre a experiência de morar fora. E ele foi se espalhando pelo mundo… Foi lido por brasileiros na Europa, na Austrália, na América Central, na Ásia… em lugares que eu jamais imaginei alcançar. De alguma forma, eu já havia chegado lá. Eu havia ido muito mais longe. 

Foi aquele texto que me trouxe os primeiros “trocados” através do blog. E foi com aqueles trocados que eu consegui comprar a passagem pra Tailândia, Vietnã e Camboja. Foi o texto que me trouxe novos amigos, novas oportunidades e o meu velho amor, hoje marido. Foi naquele março, sentada num ônibus, que eu escrevi algo capaz de atingir milhares de pessoas. 

Mais importante do que se tornar viral, aquele texto me fez perceber que eu era capaz de conquistar o mundo – one step at a time. Eu só precisava acreditar na minha capacidade de ir mais longe. De chegar em qualquer lugar do mundo. 

Eu sou do time que não tem medo de quebrar a cara. E com a minha cara de pau eu já consegui muitas coisas nessa vida. De nada vale sonhar, reclamar, chorar, rezar, pedir muito algo se você não acreditar que pode e, se você não arriscar. 

Não planeje tanto, não pense no que poderia dar errado. Ficar parado sonhando já não é um erro gigantesco? Um dia eu sonhei com tudo isso. E não descansei enquanto “isso” não deixou de ser sonho. Go ahead. Take the next step. Just do it. 

Gente é bom demais

Centro Histórico de Guadalajara, Fev. 2017

Eu sou muito de observar, sabe? De vez em quando uso a desculpa de que isso é hábito de jornalista que quer estar a par de tudo. Na verdade, eu uso essa desculpa sempre. Balela, eu sou é curiosa ao extremo. E isso não muda nem que exista um rehab à altura daquele no qual a Britney Spears se internou em 2007, atuando na causa. 

Já que estou sendo 90% sincera, bora logo admitir que também não quero mudar. Não vejo graça em não ser curiosa. Meu instinto me diz que jamais vou mudar e que continuarei pagando pra ver – sem esperar pelo troco. Eu fico pobre, mas fico sabendo das coisas. That’s ok. 

Eu ando na rua observando as pessoas, numa pegada meio Esquadros, de Adriana Calcanhoto, mas sem temperar com toda aquela melancolia, porque ninguém merece, né? 

Eu gosto de gente. De ver gente. De falar com gente. De ouvir gente. De entender – nem que seja um pouco – gente. Das cores da gente. Da cultura. Dos hábitos. Eu gosto de saber o que faz certo tipo de gente seguir em frente e o que faria essa gente pausar. 

Centro Histórico de Guadalajara, Fev. 2017
No Brasil, eu gostava de ficar em silêncio para ouvir o som do mar. No Canadá, ainda hoje eu paro para observar os flocos de neve cobrindo as ruas de branco, as árvores que se vestem diferente a cada estação ou paro para tomar um café, pensar na vida e observar as pessoas ao meu redor 

 Na Tailândia eu parei e fiquei em completo silêncio quando ouvi pela primeira vez o som dos bichos nos arrozais. Uma paz sem tamanho. O canto dos grilos, dos sapos e aquela imensidão de verde, mais nada. 

Chiang Mai, Tailândia, julho de 2015


No Camboja, gastei dias observando a pobreza daquele povo e como as crianças eram felizes com pouquíssimo. Não havia silêncio de dia e sim, muito barulho. Parei para observar o comportamento dos monges e a paz que eles transmitem. 

Phnom Penh, Camboja, agosto 2015

No Vietnã, apertei o botão pause quando vi a beleza das tribos que vivem em Sapa, nas montanhas. A coisa mais linda do universo. 

Sapa, Vietnã, setembro 2015

Nos Estados Unidos eu parei para observar de tudo! A loucura que é New York, a beleza do canal que corta Chicago, os sonhos que se tornam realidade na Disney, a beleza das montanhas na Califórnia. Mas o cair da noite no deserto foi o que me tirou o fôlego. Que espetáculo, putaqueopariu mermão! 

Joshua Tree, Califórnia, fev. 2017

No México, eu paro a todo instante para sorrir para as pessoas, porque elas vivem sorrindo de volta. Dá vontade de abraçar todo mundo que encontro. 

E nas minhas andanças pelo mundo, quanto mais gente eu observo, mais apaixonada pela vida eu fico. 

Se tem uma coisa que vale muito a pena nessa vida é ver gente: diferente de mim, diferente de você, diferente de todo o mundo. Gente como a gente, mas bem diferente, entende?

Gente é bom demais. 

Nós dois, duas malas e quatro países 

Depois das férias de um mês e meio que se estenderam por 9 meses no Brasil, voltamos ao Canadá no final de janeiro. Uma passagem beeem rápida pelo inverno canadense! 

Ficamos em Toronto por apenas duas semanas – tempo suficiente para resolver algumas pendências, organizar as nossas coisas, rever os amigos e perceber que não estávamos muito afim de curtir o frio. No dia 8 de fevereiro partimos para Los Angeles, Califórnia, e lá ficamos por 10 dias. Eu já sabia que ia amar aquele canto do mundo, óbvio. Quem não gosta da Califa, gente? 

Os famosos coqueiros
LACMA – vale a pena a visita ao museu
Sou daquelas que não resiste a uma parede cheia de rabiscos. Essa aqui é no Café Gratitude, um vegano maravilhoso em LA
 

Não escolhemos Los Angeles à toa. O Marc quueria participar de uma conferência de investidores que aconteceria na cidade no dia 15 e, como ainda não conhecíamos a Califórnia, saímos de Toronto com apenas a passagem de ida. 

Santa Mônica Píer
Runyon Canyon, trilha queridinha dos famosos pelas montanhas de Hollywood. A vista é sensacional!
Pink Wall na loja Paul Smith, localizada na Melrose Ave.


The Last Bookstore, em downtown de Los Angeles. Se você é louco por livros, vai morrer de amores por esta livraria

Cactos e Joshua trees

Além de explorar Los Angeles, passamos dois dias no deserto. Dirigimos por mais ou menos duas horas até Joshua Tree – o cenário durante o percurso é de tirar o fôlego! Foi uma experiência completamente diferente de tudo que já havíamos feito. Você se sente num daqueles filmes de faroeste estrelados por John Wayne! 

Pagamos $25 para entrar no Parque Nacional de Joshua Tree e o ticket dá direito a retorno por sete dias
Aritta, a rainha do deserto
O parque é imenso e oferece muitas trilhas! Fizemos uma de 6km subindo uma montanha até chegarmos numa mina desativada
Ventava bastante nesse dia e na sombra fazia um friozinho. À noite faz muito frio no deserto.
Nos apaixonamos por Joshua Tree, que fica bem perto de Palm Springs, outra cidadezinha bem famosa perto de LA. A casa na qual ficamos foi um achado, pois desde que apareceu em um editorial de moda da Vogue (só ficamos sabendo disso depois) vive ocupada. Apesar de super simples, a cabine era a coisa mais charmosa do mundo! O único problema era ir ao banheiro de madrugada, já que ele ficava do lado de fora e eu sou do tipo que morre de medo do escuro. E já que mencionei a nossa casa…

Airbnb é vida

Como faz muito tempo que não atualizo os leitores sobre o meu paradeiro, acabei nem comentando sobre o nosso vício em Airbnb. Pra quem não conhece, é um aplicativo no qual você acha quartos ou casas/apts com preços muito mais em conta do que hotéis. Você lê os comentários de quem já se hospedou nos locais e consegue ter uma boa ideia sobre a qualidade, conforto e segurança do local. Acho muito mais legal do que ficar em hotéis pois me sinto “em casa”. Além disso, para quem não se importa em se hospedar na casa de alguém, a interação entre o hóspede e o dono da casa pode ser mais uma vantagem em relação aos hotéis. 

Já alugamos somente quartos e também casas só pra nós e nunca tivemos problemas! Farei um post só sobre as nossas experiências com Airbnb no Brasil, Canadá, Estados Unidos e México. 

A nossa cabine no meio do deserto
Já pode voltar? Dêem uma olhada na vista que a gente tinha ao acordar
Posando de blogueira, né?
Me apaixonei pelos detalhes na decoração da casa
Aproveitamos que estávamos no paraíso e na manhã do dia 14 –  meu aniversário – renovamos os votos de casamento e fizemos as fotos no Parque Nacional de Joshua Tree. 

Dia super especial!
Aqui, estávamos num dos pontos mais altos do parque, de onde se tem a melhor vista. Pensem num vento frio?


Recapitulando: ao chegar nos EUA ficamos 4 dias em Los Angeles, num airbnb bem pertinho de Hollywood. No quinto dia, partimos pra Joshua Tree, no deserto californiano, onde ficamos até o dia 14. Voltamos pra LA e ficamos num airbnb em Venice Beach. 

Venice Beach
Santa Mônica

Passamos mais 4 noites em Los Angeles e seguimos pra Las Vegas (que não estava nos planos, mas eu nem lembro por qual motivo acabamos indo parar lá hahaha). Ficamos 4 dias naquela loucura (a cidade é linda, mas eu tô muito velha pra toda aquele furdunço). Fizemos um tour de helicóptero para o Grand Canyon, que estava na minha lista de lugares que eu queria muito conhecer, e eu quase tive um ataque do coração quando o Marc me disse que iríamos pra lá! É ainda mais lindo do que eu imaginava. 


 

Tequila e Mariachis 

Na nossa última noite em Vegas, discutimos sobre o que faríamos nos próximos dias e para onde seguiríamos. Não chegamos num consenso – o Marc queria seguir para Utah – e eu queria conhecer San Diego e San Francisco – então, compramos passagens aéreas para Guadalajara, no México. Tudo a ver, né? 

Grand Canyon e México: dois sonhos realizados no mesmo dia! 

Centro Histórico de Guadalajara
Centro Histórico de Guadalajara
Há muitas esculturas e instalações de arte espalhadas nas praças do centro histórico
Enquanto escrevo esse texto, estou sentada no terraço da casa que alugamos aqui na segunda maior cidade do México. Vejam que fofa, apesar de bem simples… 

A dona dessa casa é Canadense e se mudou pra ca há 6 anos. Alugamos a casa inteira e ficamos aqui até meados de março
Escritório

Eu sempre quis conhecer o país! Sou apaixonada pela cultura, pelo colorido e pela comida mexicana… tem coisa mais gostosa do que tacos e guacamole gente? E o preço das coisas? Tudo muuuito barato: comida, transporte, aluguel…. Chocada! 
Mercado San Juan de Dios, o maior mercado de Guadalajara. Fiquei louca com o tanto de coisa que a gente encontra lá
Carne en su jugo no Mercado San Juan de Dios
Aliás, esqueça tudo que te ensinaram sobre comida mexicana. Fiquei chocada na primeira noite que saímos para jantar! 

Eu não conhecia quase nada do cardápio além de tacos e quesadilla, que por sinal são completamente diferentes da comida mexicana que a gente come no resto do mundo. Fiquei uns 20 minutos analisando o cardápio e passei o maior sufoco pra pedir a comida. No final das contas, deu tudo certo (fora as tortillas que a gente não esperava serem suuuuuper picantes). 

Ainda não temos uma data pra voltar pro Canadá. O Marc tem a sorte de poder trabalhar de qualquer canto do mundo e, enquanto não fincamos raízes em um só lugar, continuo fazendo alguns freelas e tentando focar no blog, que anda muito abandonado. Vamos ficar aqui mais umas semanas, pelo menos até o meio de março. Quando sentirmos que é hora de irmos para outro lugar, a gente discute as possibilidades por alguns minutos e, se não chegarmos a um consenso, giramos o globo e seguimos pra onde o dedo apontar.

Sorry pelo post gigantesco!
¡Hasta luego! 

Que nunca nos falte vontade


Casei!

Cheguei do fórum, tirei o salto, coloquei a certidão de casamento na cabeceira da cama, dei um beijo no marido (ain, que estranho falar marido) que se mandou pro futebol e fiquei imóvel na cama. Olhava pro teto e me perguntava: e agora? O que a gente faz? O que vai mudar?

O casamento não foi planejado. Não, eu não estou grávida e não casamos pra que eu tenha a cidadania canadense, nada disso. Vamos combinar que quem conhecer o meu marido e a sua paixão pelo Brasil vai achar que ele sim, tava querendo ganhar a cidadania brasileira. O cara é tão louco pelo Brasil que quer mudar o nome pra João. Isso é conversa pra outro post…

A gente se ama muito, mas casar não era algo que planejávamos para este ano. Nem mesmo pro ano que vem. Fazíamos mil planos envolvendo viagens e outros programas a dois, mas nunca tocávamos no assunto casamento. Já havíamos combinado de morar junto assim que retornássemos do Brasil. Por conta disso, antes de vir, empacotei todos os meus pertences e deixei no porão da casa que alugava com amigos. Ele fez o mesmo.


Viemos apenas de férias do Canadá para o Brasil (eu no final de abril e ele no início de junho). Eu havia acabado de me formar e já não via a família há mais de dois anos. O plano era passar uns 40 dias por aqui e depois voltar. Mas, no dia do embarque, cancelamos os voos. Ah, os planos…

Descobri que o meu avô, que me criou desde que eu era uma pirralha, estava com um câncer super agressivo na bexiga. À medida que a minha viagem se aproximava, ele piorava. E foi vendo a minha tristeza e o meu desespero em querer ficar no Brasil para cuidar do meu avô, que o Marc me pediu em casamento e me prometeu estar ao meu lado enquanto eu cuidasse do meu velhinho. E ele esteve em todos os momentos.

Foram meses difíceis. O Marc me acompanhava até quando eu dormia no hospital com o meu avô. Imagino que a maioria dos casais tenha dias de pura paixão logo após o pedido de casamento. Eu nem lembrava que ia casar. Também fiquei um pouco mais fria com o Marc, pois estava sensível demais. E ele me compreendia.

Foi o Marc que levantou o meu avô nas duas (ou três?) vezes que ele caiu de madrugada, enquanto tentava ir ao banheiro sozinho. Ele nunca reclamou de nada. Nem mesmo cogitou me deixar aqui sozinha.

O casório seria em dezembro. Com a piora do meu avô, o padre aceitou vir celebrar o religioso aqui em casa, no dia 8 de outubro. Contei no post anterior que ele faleceu no dia 26 de setembro. Cancelamos o religioso, pois seria muito doloroso realizar a cerimônia logo após a sua morte.

Eu tive uma crise na noite anterior ao casamento civil. Discutimos por algum motivo bobo e eu entrei na neura de achar que talvez eu houvesse me precipitado em casar assim logo depois do pedido, sem programar nada, sem pensar muito, sem fazer planos. Como se esses mais de quatro anos de idas e vindas não fossem suficientes para que eu tivesse certeza do quanto nos amamos. Como se esses quatro meses dele aqui, ao meu lado, não bastassem para me mostrar que eu tenho um parceirão ao meu lado.


Planos.

A palavra ecoava na minha cabeça enquanto eu olhava pra aliança, escolhida às pressas na primeira loja que achamos. A gente se apega tanto à ideia de que devemos fazer planos, nos programar, fazer listas, cumprir a ordem “natural” de algumas coisas. Eu não sei vocês, mas a vida me deu umas rasteiras brabas, só pra me mostrar que quem manda é ela. Aprendi a lição e deixo ela quietinha seguir o seu curso.

Dias atrás perguntei ao Marc se ele tinha certeza que queria casar comigo. Com sua sinceridade fora do normal ele me disse: – Certeza eu não tenho, pois a única certeza da vida é a morte. Eu tenho muita VONTADE e acho que isso, aliado ao amor que eu tenho por você, já é suficiente.

Ele fez questão de enfatizar a palavra vontade.

Bingo. Esse cara tinha mesmo que ser meu marido.


Sem planos, sem listas, sem saber o que faremos amanhã e sem ter certeza se a hora era certa, mas com muita vontade de seguirmos juntos por aí, a gente se casou. Foi simples, meio improvisado e lindo.

O que eu espero daqui pra frente? Que nunca nos falte VONTADE.
 

 

Não, dessa vez não foi a bunda virada pra lua


Dizem por ai que quem grita aos quatro ventos que é muito bom naquilo que faz é convencido. Ou que adora se exibir. E a gente se acostuma a esconder muito do nosso orgulho, não o orgulho desdém, mas aquele que nos faz dar dois pulinhos em frente ao espelho do quarto, enquanto estamos sozinhos, depois de termos passado em um exame, sermos promovido ou após qualquer outra conquista, só pra que não nos chamem de “nada modestos”.
A gente canta vitória só com os amigos mais chegados, ou nem mesmo com eles, pois tem sempre um que fala sobre a tal da energia negativa e da inveja. “Ih, pare de falar sobre o seu sucesso, tem gente que vai se morder de inveja”, nos dizem.

E com isso a gente se esquece até de dar os pulinhos em frente ao espelho, porque o tal do costume em internalizar a felicidade torna a comemoração do nosso sucesso cafona, arriscada e desnecessária.

Esquecemos também das qualidades que a gente tem, porque quase nunca falamos sobre elas. Já percebeu o quanto é difícil fazer o seu próprio currículo? E porque a gente precisa praticar tanto para uma entrevista de emprego, se tudo que a gente precisa fazer é falar sobre as nossas qualidades e competências?

Demorou uma eternidade, mas certo dia me dei conta de que passei muito tempo sem reconhecer o quanto havia conquistado. E que eu nunca pulava em frente ao espelho e quando vibrava o fazia sem muita empolgação, pois sempre achava um motivo para atribuir as minhas conquistas a outros fatores e não à minha capacidade. É a chamada Síndrome do Impostor, descoberta lá pelos anos 80 e que atinge 70% da população, principalmente as mulheres.

E sabe porque a síndrome leva esse nome? Pois com as conquistas, muitas vezes vem o sentimento de “fraude” e de que a qualquer momento alguém vai descobrir que não somos tudo aquilo que os outros pensam.

A gente se convence de que os elogios e o reconhecimento dos outros pelo nosso sucesso nem sempre são merecidos, e atribuímos as nossas conquistas à sorte, a um empurrãozinho dado por alguém ou, sei lá, ao horóscopo do dia.

Demora um bom tempo para que a gente deixe de lado a vergonha de se exibir, de assumir que se tem talento e a não ter medo de dizer que não, não foi porque você é aquariano nascido no terceiro decanto ou porque Saturno está em Sagitário que você se formou com louvor, conseguiu o emprego dos seus sonhos ou foi promovido. Você conquistou tudo isso porque merecia. Porque fez a sua parte.

Mas e a sorte, mulher? Não tem gente que nasce com a bunda virada pra lua? Ih, ô se tem. A sorte ajuda sim. E muitas vezes. Mas eu disse A-J-U-D-A. Pois a sorte não te dá o emprego dos sonhos, não te transforma num aluno exemplar e não tem influência alguma no quanto os outros vão admirar o seu trabalho. O nome disso é talento, força de vontade e persistência. O nome disso é VOCÊ. E ninguém vai tirar o seu mérito.

Agora vai ali na frente do espelho e dê dois pulinhos pra comemorar uma conquista recente. Não, relaxa que você não vai parecer que é bobo. Bobagem mesmo é não reconhecer que você é capaz de conquistar o mundo. Ou que já conquistou e ainda nem percebeu.

 
*Aritta Valiense era jornalista e achava que não tinha talento algum até criar asas e coragem para desbravar o mundo. Foi viver no Canadá, onde descobriu que não só tem talento, mas também capacidade para fazer um monte de coisas legais. Acaba de se formar com louvor em Marketing e nas horas vagas gosta de dar pulos de felicidade para comemorar todas as suas conquistas. 

Estudar no Canadá… Vale a pena?

Foto: Patrick Tomasso

Em dez dias completo o meu curso de Business Marketing no George Brown College, em Toronto, no Canadá. Foram dois anos que passaram voando, apesar das noites em claro, do estresse, exaustão e das crises de choro quando achava que não conseguiria chegar ao final. 
Parece exagero, eu sei. Mas, para aqueles que se doam por inteiro e mergulham de cabeça nos seus sonhos, a vida vem mesmo temperada com uma pitada a mais de drama. E põe drama nisso…
Eu nunca quis ser uma aluna medíocre. Comecei o curso com o foco em ser uma das melhores. Tive muita dificuldade com as matérias de exatas, e essas foram as que me fizeram chorar. Mas eu meti a cara nos livros e superei o meu trauma com os números.

E ai, valeu a pena?

Muita gente me escreve perguntando se vale a pena vir fazer um college no Canadá. E hoje, às 11 da noite, após um dia super cansativo, com reuniões de projetos finais, uma prova e uma dor de cabeça daquelas, sentei na minha cama rodeada por papéis, resumos e anotações das oito matérias que estou cursando e decidi escrever para desabafar. Eu tô uma pilha, pronta para desabar. Mas, vou fazer aquilo que mais gosto: escrever.

  
Vale a pena todo o esforço, dinheiro e tempo investido?

Eu diria que vai sim, valer a pena, se você levar em consideração alguns fatores… 

Prepare o bolso: O investimento é alto. O semestre no college irá te custar uma média de 8 mil dólares. Multiplica por dois e, em um ano você vai ter gasto, no mínimo, 16 mil dólares só com o valor do curso. Você ainda terá que investir em livros, que, novos, custam em média $120 dólares cada (por baixo, pois já paguei $160 em um único livro). Em outros cursos, como arquitetura, eles são ainda mais caros e você desembolsa entre $200 e $350 por livro. 

Livros usados são vendidos por uns $60-$80. Alguns professores exigem que você compre materiais novos, pois eles trazem um código para atividades online que só pode ser usado por um aluno. São 6 a 7 matérias por semestre. Faz a matemática, pois como eu falei antes, tô exausta.

Você vai ter que ESTUDAR MUITO: Os semestres aqui são mais curtos. Se as aulas começam em janeiro, terminam em abril. Se começarem em setembro, terminam em dezembro. Ou seja, você tem 4 meses para frequentar as aulas, fazer mil trabalhos, apresentações, projetos em grupo, testes e provas finais. Uma coisa que eu aprendi durante os meus dois anos de college é que você não precisa ter um inglês perfeito e não precisa ser super inteligente para se dar bem nas aulas. Você precisa mostrar interesse, responsabilidade e organização. O aluno que frequenta as aulas, não se atrasa, pergunta, participa das discussões, entrega os trabalhos em dia e envia e-mails aos professores sempre que tiver dificuldades nas aulas, é aquele que os professores reconhecem e podem ajudar no futuro. 

Reconhecimento dos professores VALE OURO: Quando digo que dei o melhor de mim durante os dois anos de faculdade aqui, algumas pessoas acham que eu me esforcei demais sem necessidade alguma. Tinha necessidade, sim. O college é, para muitos de nós, estudantes internacionais, a chance de reconstruir uma carreira. É um recomeço. Não se trata apenas do dinheiro investido, pois muitos não ralam tanto, tiveram a sorte de ter condições financeiras para arcar com tudo sem doer tanto no bolso. O que muitos não percebem é que viemos para um país no qual a maioria da população é formada de imigrantes que, sedentos por uma vida melhor, correm atrás de qualificação, cursos, especializações e etc. Tem muita gente qualificada.

Em entrevista de empregos, uma carta de referência é super importante. Além disso, os professores que te reconhecem como um bom aluno, te convidam para participar de eventos com profissionais da sua área e te ajudam muito nos primeiros passos para encarar o mercado de trabalho. Quando você estiver escolhendo as suas aulas, vale a pena visitar alguns sites nos quais os professores são avaliados pelos alunos e escolher aqueles com as melhores pontuações.

Preocupe-se com o seu GPA: O GPA (Grade Point Average) é a sua média em cada curso. Ao final de cada semestre você recebe um transcript (boletim) com todas as médias e o seu GPA final. Você pode alcançar no máximo 4 pontos no seu GPA e os alunos que alcançam 3.5 ou mais do que isso, entram na lista do Dean (reitor). O Dean te envia uma carta parabenizando pelo seu desempenho e por ter entrado na lista dos melhores alunos, com um GPA superior a 3.5. Nem todas as empresas irão perguntar pelo seu GPA, mas muitas perguntam. E ter no seu currículo que você se formou com honra – GPA final superior a 3.5 – é um extra.

Esqueça o famoso “jeitinho brasileiro”: Aqui não tem mimimi nem chororô. Perdeu a data de entrega de um trabalho, o professor pode até te liberar para entregar no outro dia. Mas, vai descontar uns 20% da sua nota. Você pode inventar que estava internado no hospital, pode “matar” parente distante, dizer que houve uma inundação no seu banheiro, que foi atropelado por uma bicicleta, que o seu projeto foi comido pelo seu urso de estimação… Nem adianta. Os trabalhos devem ser entregues no dia, ou pontos serão descontados. 

Porém, se você for um bom aluno e se der mal em um trabalho ou prova, não deixe de pedir uma segunda chance. Há poucos dias eu tirei 6 em uma prova, escrevi para o professor explicando que a nota era muito baixa comparada às outras e que gostaria de ter uma segunda chance, pois eu não aceitava nada abaixo de 8. Claro, eu me “vendi” no e-mail, pontuando todas as minhas qualidades como aluna, a minha participação nas aulas e porque eu merecia uma segunda chance. Ele é o meu professor de Vendas, então eu usei as técnicas aprendidas em aula para escrever o e-mail. 

O professor ficou super impressionado com a minha coragem e com a forma com a qual eu usei os conceitos das aulas para me vender como uma aluna que merecia uma segunda chance. Ele disse que apenas eu e mais um outro aluno haviam pedido uma segunda chance, apesar da maioria da sala ter se dado mal. E que ele jamais esquecia dos alunos esforçados. Para a minha felicidade, ele me deixou refazer a mesma prova uma semana mais tarde.

Enfim…

Eu poderia escrever um texto gigante com muitos outros pontos que devem ser levados em consideração caso você decida estudar aqui no Canadá. Porém, a verdade é que tudo que escrevi ai em cima se resume a uma só frase: sem dedicação, o seu investimento não vai te trazer retorno algum. E isso não é apenas para aqueles que vão estudar no Canadá, mas em qualquer lugar do mundo.

Se você vai pagar um preço alto e se matricular no College apenas para dar entrada nos papéis da imigração, eu acho que você está desperdiçando a chance de adquirir conhecimento, se profissionalizar e construir uma carreira de sucesso no país que escolheu morar. Passar nas matérias não é difícil. Mas, de que adianta passar se você não vai ter as qualificações necessárias para conseguir um bom emprego?

É um investimento alto? É. E põe alto nisso. 

Mas, eu prometo que, se você se dedicar e colocar na caixola que você quer fazer a diferença e não apenas ser “só mais um imigrante tentando ganhar a vida em outro país” os seus esforços serão reconhecidos. E, quando isso acontece, você se torna ainda mais forte e mais seguro de que fez a escolha certa. Você se sente tão orgulhoso pelas suas conquistas que todo o investimento, tempo, esforço e dedicação farão sentido.

Você colocou uma mochila nas costas, deixou para trás a família e amigos, saiu da sua zona de conforto e enfrentou o mundo. E o mundo te mostrou que para enfrentá-lo, você precisava enfrentar a si mesmo e redescobrir os seus limites. É nessa batalha entre você e o mundo que você descobre que os seus limites vão muito além do que você imaginava. Basta você se esforçar. E dar o melhor de você aonde quer que você vá. O resto? Ah! O resto o mundo se encarrega de te presentear. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O meu tio não era louco


Foi um cara que nunca conheceu o tédio. O tipo de pessoa que transformava uma conversa informal sobre sapatos numa explicação completa sobre a anatomia do pé. Eu tinha muitas razões para o admirar. A  minha favorita era o fato de saber que ele nunca me deixaria sem uma resposta. E ele não deixava.

Tio Aroldo sofria de transtorno bipolar. E era também o cara mais inteligente que já conheci. Para quem não sabe, o transtorno bipolar é uma doença psiquiátrica caracterizada por variações do humor, crises de depressão e o surgimento de algumas manias. É como viver em uma montanha russa. Em certos dias a pessoa está depressiva, noutros ela está eufórica. Pode ser bem difícil de lidar (como no caso do meu tio), mas muitos conseguem controlar o transtorno com o acompanhamento de um psiquiatra e o uso constante de medicamentos. Infelizmente, não tem cura.

Foi o meu tio Aroldo que, mesmo sendo pão duro de carteirinha, no início da minha adolescência me levou numa loja bacanérrima para me dar a minha primeira calça “de marca”. Eu era apaixonada pelos meus jeans da Yes Brazil. No meu corpinho enxuto de adolescente, a calça caía como uma luva. Tio Aroldo tinha bom gosto e se preocupava com os pequenos detalhes.

No inicio eu não entendia muito bem quando as crises aconteciam. De repente ele falava mais do que o normal, ficava bastante eufórico e se tornava mais sincero do que já era. Falava tudo que desse na telha e muitas vezes arrumava confusões com os conhecidos da nossa cidade, que não é tão grande e nem tão pequena. O chamavam de louco. E eu, sem muita maturidade, mas cheia de amor pelo meu tio, me doía por dentro cada vez que o via daquele jeito.

A risada de alguns amigos, o pouco caso feito por conhecidos e a tristeza dos meus avós ao tentar lidar com uma doença ainda pouco conhecida machucava muito todos que o amavam. Ninguém sabia direito o que era a bipolaridade. E, até que alguém explicasse o que levava aquele homem bem vestido a usar óculos escuros à noite, enquanto gritava com desconhecidos no meio da rua, era mais fácil dizer que ele tinha, sim, um parafuso a menos. O meu tio não era louco. O meu tio era um cara normal que de vez em quando ficava doente.

Ele cortava o bife em pedaços minúsculos. Misturava farinha e um pouco de pimenta no arroz com feijão e, assim como eu, não resistia à jarra de sucos. Comia em frente à TV, tinha uma coleção de camisas da Lacoste e usava sempre o mesmo perfume – CK One. O bigode era a sua marca registrada. Ele era charmoso.

As crises vinham sempre depois de algum abalo emocional. O fim de um relacionamento, a morte de alguém especial, uma crise financeira. Não podíamos prever. O tratamento também não era tão simples. Nem sempre ele concordava em tomar os medicamentos. Sem ter como lidar com as crises mais graves, não tínhamos outra solução a não ser interná-lo.

A última crise do meu tio foi também a pior de todas. Eu tinha 19 anos e morava com uma prima no apartamento da nossa família, em Salvador. O meu pai havia sido levado pelos meus tios para a capital, numa tentativa frustrada de interná-lo numa clínica de reabilitação para usuários de drogas. Ele conseguiu fugir de volta para Porto Seguro e acabou não fazendo o tratamento. Enquanto isso, o meu tio Aroldo, que também estava conosco em Salvador, começou a apresentar alguns sinais de que não estava muito bem. Acredito que ver o meu pai naquela situação havia mexido muito com o seu emocional. Eles eram muito próximos.

Assim que percebemos que ele estava agitado, tentamos convencê-lo a tomar os remédios. Após alguns dias, a situação piorou. Certo dia, chegamos da faculdade e o porteiro do nosso prédio informou que o nosso tio estava gritando na varanda. Não bastassem os gritos, abri a porta e dei de cara com ele pelado, usando apenas o seu inseparável Ray Ban.

Ele se recusava a aceitar ajuda. Quando mencionei que o levaríamos ao médico, ele ficou ainda mais agressivo. Eu me dividia entre a tristeza em ver o meu tio naquele estado, o medo de uma tragédia ainda maior, a preocupação em resolver tudo sem precisar da ajuda da família (que já estava lidando com o meu pai em Porto Seguro), a vergonha em saber que todos no prédio comentavam sobre a situação no nosso apartamento e o medo de não ser forte o suficiente e falhar em ajudá-lo.

Liguei para um amigo e expliquei que precisávamos de uma ambulância e de pessoas preparadas para levar o meu tio à força para a clínica psiquiátrica. Nunca vou esquecer daquela cena. Eu chorava e não conseguia o encarar. Evitava o seu olhar pois não queria deixar que aquele homem que me xingava e me acusava de o estar imprisionando, apagasse a memória que eu tinha do tio doce, carinhoso e inteligente que eu tanto amava. Ele era apaixonado pelos seus sobrinhos. Para alguns de nós, ele era um pai. E para ele, éramos os filhos que ele nunca teve.

A primeira visita à clinica foi terrível. O ambiente era triste e ele não quis nos receber. Lembro de termos levado frutas e biscoitos, mas ele se recusava a falar comigo, pois acreditava que eu o havia traído ao interná-lo. Naquela noite tive problemas para dormir. A minha prima dividia a cama comigo, pois por um bom tempo desenvolvi uns ataques de pânico e não dormia sozinha.

Na segunda visita eu fiquei ainda mais assustada. O meu tio estava completamente dopado. Mal conseguia falar e eu não consegui ficar lá por muito tempo. Ele ainda estava bastante magoado comigo. Eu era uma adolescente que estava prestes a terminar a faculdade, sofrendo com os problemas do meu pai e com um tio internado em uma clínica psiquiátrica. Chorava enquanto tomava banho e ficava embaixo do chuveiro o tempo necessário para que ninguém percebesse o quanto eu estava triste.

O dia em que tio Aroldo saiu da clínica foi um dos mais felizes da minha vida. Ele já não estava mais triste comigo e fez de tudo para demonstrar a sua gratidão pelo que eu e a minha prima fizemos por ele. Comprou os móveis que eu tanto queria para o meu quarto e tentava nos agradar ao máximo. Tio Aroldo sempre tinha um comentário na ponta da língua. Certa vez, enquanto eu estudava para um dos testes ele disse: – Arittinha, nenhuma prova é mais importante do que as que você ja superou. Nenhuma nota vai ser capaz de traduzir todo o conhecimento que você tem e nenhuma escola vai te ensinar o que você realmente precisa saber. Vence na vida quem tem coragem e curiosidade.

Tio Aroldo sofreu um infarto fulminante três anos mais tarde, seis meses após o meu pai falecer. Foi um ano muito difícil para a nossa família. Os meus avós perderam dois filhos em apenas seis meses. Os meus tios perderam dois irmãos. Os meus primos perderam dois tios. Eu perdi o meu pai e também perdi o único cara que jamais se esquivava às minhas perguntas. E, apesar de tentar compreender a morte de forma racional, sinto que ele foi cedo demais e me deixou sem algumas respostas. Também acho muito injusto que muitos jamais tenham tido a chance de conversar por ao menos cinco minutinhos com o meu tio. Ele era sensacional.

É triste saber que tanta gente pouco sabe sobre o transtorno bipolar. Muitos olham o bipolar com desprezo, se envergonham (eu também me envergonhava) quando as crises são intensas ou quando ocorrem em público. Muitos se afastam, não conseguem lidar com os transtornos de humor ou com a agressividade de quem tem a doença. Eu não os julgo, pois não é fácil. Porém,nada é mais difícil do que perder aqueles que a gente ama, sejam eles loucos ou não.

Sabe aquele cara que mora ali do outro lado da rua e de vez em quando age meio estranho? Aquele que todo mundo diz ser louco? Ele podia ser o meu ou até o seu tio. Mas, tio Aroldo não era louco. Ele era o cara que tinha respostas para todas as minhas perguntas.